segunda-feira, abril 24, 2006

No dia em que eu queria ter mãos de fogo e peito de aço

Segunda vez que tenho o desprazer de sentir a cor de um “cano” ao meu lado. Naturalmente os olhos não encaram. Não lembro da pele, muito menos dos olhos. Quatro amigos no carro, vontade de eternizar um dia feliz com a noite instigada e continuar com nosso sentimento de “protegidos” na nossa cidade. No entanto, uma ponte “inacessível” nos desviou, levou nosso carro ao encontro do outro lado, da realidade, do que não queremos ver, sentir ou imaginar.
Entre carroças de lixo pessoas dançavam e bebiam seus desamparos e esquecimentos, e nós também queríamos apenas isso, esquecer nossas limitações e descrenças com uma “alienação musical”. Enfim, os caminhos se encontraram, mas éramos os “cocotas” dentro da cidade de deus. Antes havia um sentimento de revolta social, diante do forte cheiro de lixo, mas um leve pensamento de que mesmo assim, as pessoas estavam se divertindo. Esse sentimento durou pouco, muito pouco por sinal.
Uma arma apontada, nervosismo a flor da pele e o que nos pertencia foi levado por quatro mãos pedidas. Voltamos pela mesma rua que entramos, passamos pelas mesmas pessoas que, provavelmente, já previam o ocorrido. Algumas olhamos nossas caras angustiadas e desconcertadas, outras bailavam como se nada tive acontecido, ou apenas emitindo um recado corporal, “aqui é assim! E a vida segue”.
Fomos embora, sem nossa tranqüilidade, sem nossos sorrisos, sem nossa alegria, sem nossa esperança. Voltei para casa com um sentimento de impotência, de revolta, diante da privação da minha liberdade e da decadência social. Castraram meus ideais, minha fé nas transformações, blasfemei. Mas os carrascos não foram eles, não são eles. Eles refletem o que cada um de nós temos hoje, nada!
Ainda acredito, confesso, sem romantismo, sem fantasia, mas ainda acredito. A arte, a música, a literatura pode ser um caminho para enfrentarmos esse desamparo da sociedade. Pensemos! Ajamos! Cuidemos!

4 comentários:

Ivana de Souza disse...

Ai, Beta, na hora mesmo é foda. Mas, como sempre, a esperança é a última que morre. Até porque, não há como seguir, se não acreditamos mais.

betita disse...

exatamente, minha linda. Esses não vão tirar meu sossego nem minha esperança, mas que tiraram minha tranquilidades e meus documentos tiraram. hahahaha, agora só rindo mesmo.

Gabi * disse...

Caramba, Betita! Anne me contou por alto o que aconteceu com vcs. Uma vez meu pai me disse que ser assaltado aqui no Rio era questão de tempo. O sortudo que nunca foi, estará sempre na iminência de ser. Claro que isso não é regionalizado, mas é uma verdade que demoro pra digerir. Desce arrastada na minha garganta. Enquanto isso, só nos resta continuar levando a vida e bebendo umas cervas que isso sim não faz mal a ninguém.

betita disse...

É Gabi, muito triste. Fiquei muito mal. As cenas ficavam se repetindo na minha cabeça...enfim, foi um se ligue. Um chero grande